terça-feira, 12 de maio de 2009

Uma boa prova!

Caros Amigos,

queria colocar aqui uma das provas que me agradou muito, para que vcs possam compara-la com as suas e ver o que podem aprender dela, e assim melhorarem para a próxima prova.

Divirtam-se:



1) De modo genérico, explique qual é a função da Meditação Primeira, quais são seus objetivos e de que estratégia ela se utiliza para alcançá-los?

Obs: todas as citações em aspas se referem a tradução de J. Guinsburg e Bento Prado Júnior da Meditação Primeira.

A função da Primeira Meditação é a de análisar e encontrar tudo o que pode ser posto em dúvida. Descartes a inicia relatando que todas suas antigas opiniões se baseavam em bases muito incertas, acumuladas desde seus primeiros anos. A Meditação Primeira serve-lhe justamente como um meio de desfazer-se de todas essas suas tão incertas opiniões antigas. O objetivo expresso desta operação é “estabelecer algo de firme e constante nas ciências”. Descartes, portanto, não duvida simplesmente a fim de permanecer na dúvida. Seu objetivo, na realidade, é encontrar tudo que seja duvidoso para, ao fim desse processo, fundar um nova ciência que se baseie apenas no que então restou de certeza absoluta. Como ele próprio afirma, ele queria “estabelecer algo de firme e de constante nas ciências”.

A estratégia utilizada por Descartes para a rejeição de suas antigas opiniões é a utilização da dúvida metódica. Sua operação consiste em se rejeitar como inteiramente duvidoso, voluntariamente e através da razão, tudo aquilo em que se encontre o menor motivo de dúvida, o que lhe garante seu caráter hiperbólico. Além disso, Descartes constanta que derrubar uma por uma suas antigas opiniões não seria algo factível e nem necessário, já que, como “a ruína dos alicerces carrega necessariamente consigo o resto do edifício”, rejeitar os princípios de suas antigas opiniões já seria suficiente para rejeitar todas em bloco. A dúvida metódica, portanto, é radical. A fim de atingir tal base do conhecimento, Descartes segue uma ordem de duvidar que começa tratando dos objetos compostos e particulares e que por fim atinge as realidade mais simples e gerais, que seriam a base do edifício do conhecimento.

2) De modo pontual, explique as etapas argumentativas de tal estratégia, nos seguintes termos:

a) explique o significado do argumento que apela para os erros dos sentidos. Qual é a função de tal argumento, o campo de sua aplicação e o resultado dela?

O argumento do erro dos sentido afirma que, como os sentidos nos enganam algumas vezes, não seria prudente confiar inteiramente neles. A função deste argumento é por em dúvida a fidelidade dos sentidos, isto é, por em dúvida se as coisas como representadas pelos sentidos de fato são exatamente como as coisas são em si mesmas.

É pressuposto do argumento do sentido que existem objetos que se dão aos sentidos, o quais, por sua vez pertencem a um sujeito que está inserido no espaço. Logo, tal argumento pressupõe a existência de corpos, do sentido e da existência de um sujeito corporal dos sentidos. Logo, seu campo de aplicação é apenas as opiniões sobre os objetos sensíveis, que são objetos dos sentidos. Ele trata apenas das qualidades das coisas sensíveis, mas não duvida da existência delas.

O resultado do argumento do erro dos sentidos é mostar que as opiniões de objetos apreendidos através dos sentidos não são necessárias, mas apenas possíveis: se os sentidos por vezes mostram ao sujeito o objeto de maneira diferente do que ele é em si mesmo, nenhuma das opiniões mediadas pelos sentidos são indubitáveis, o que basta para, através da duvida metódica, rejeitá-las integralmente. Em suma, o argumento dos sentidos revela que entre o conhecimento do objeto e o objeto em si existe sempre o filtro dos sentidos, no qual não se pode confiar inteiramente.

b) Explique o significado do argumento dos Sonhos. Qual é a função de tal argumento, o campo de sua aplicação e o resultado dela?

A função do argumento dos Sonhos é generalizar o argumento do erro dos sentidos. Se esse argumento pressupunha a existência dos corpos, do sentido e do sujeito corporal do sentido, o argumento dos sonhos ressalta que toda a percepção sensível poderia não passar de uma criação da mente. Se durante os sonhos acreditamos receber estímulos sensoriais de objetos externos e possuir um corpo que recebe tais estímulos, e se de fato não há como saber seguramente se estamos dormindo ou acordados, então toda nossa existência poderia não passar de um grande sonho. Nós poderiamos, portanto, não possuir um corpo que seja sujeito dos sentidos, e mesmo os corpos que supostamente se ofereceriam aos nosso sentidos poderiam não existir. A função do argumento dos sonhos, portanto, é por em dúvida a própria realidade da percepção dos sentidos, é duvidar que haja objetos exteriores e que exista o próprio corpo que é sujeito da percepção sensível. O campo de aplicação do argumento dos Sonhos, portanto, é toda a experiência sensível.

O resultado do argumento dos Sonhos é que a existência do mundo exterior é posta em dúvida, assim como a própria existência corporal do sujeito e toda sua experiência sensível. Como duvida de maneira hiperbólica, portanto, Descartes se vê impossibilitado de concluir qualquer coisa de certo a partir do conjunto de sua experiência sensível. Outro resultado do argumento dos sonhos é que se esgotam as razões naturais - sugeridas pela experiência - para se duvidar: como depois do argumento restam apenas as realidades matemáticas, nada na experiência sugere algo de duvidoso nelas.

c) O que é a dúvida Metafísica? O que é o argumento do Deus Enganador? O que significa a figura do Gênio Maligno? Explique as diferenças e as relações entre ambos.

Após o argumento dos sonhos, nada resta que possa ser questionado a partir de dúvidas naturais, sugeridas pela experiência. As coisa simples e universais de que se compõem todas as coisas, as realidades matemáticas, aparecem à intuição intelectual como indubitáveis. Não se pode, a partir da experiência, duvidar que 2 + 2 = 4, pois mesmo sonhando isso é verdadeiro. Além disso, propriedades inerentes da natureza corpórea, suas essências matemáticas tais como extensão, número, localização etc. não podem de modo algum ser duvidadas. A dúvida de coisas de tal natureza é o que constitui a dúvida Metafísica: ela não se apoia na experiência, mas sim, fazendo direito do uso de duvidar, questiona a própria experiência. Além de não estar apoiada em razões naturais, sua outra característica fundamental é seu campo de atuação: ela não se restringe a nossa experiência sensível, mas sim engloba toda a nossa experiência, inclusive a intelectual, e é, portanto, universal. É nossa própria intuição intelectual que é posta em dúvida.

O argumento do Deus Enganador é uma possibilidade de se expressar a dúvida metafísica. Ao aventar a possibilidade de que exista um ser muito poderoso que engane o sujeito sempre que ele realize as intuições intelectuais mais simples e quando ele acredite que há um mundo exterior, Descarte instaura a dúvida metafísica explicitada anteriormente: como nem os resultados das intuições intelectuais mais simples são necessários para todos, mas poderiam o ser apenas para um sujeito, todo a validade da experiência intelectual é colocada em xeque. Note que nada na experiência diária sugere a existência de um Deus enganador. A dúvida que ele instaura, portanto, é apenas de direito, o que é outra característica da dúvida metafísica que é expressa por tal argumento.

A figura do gênio maligno é apenas uma operacionalização psicológica da dúvida metafísica. Descartes admite que nada dos fatos de sua experiência sugere a dúvida metafísica. O próprio costume de suas antigas opiniões fazem-no tender a lhes dar crédito, assim como a enorme probalidade de que tais opiniões sejam verdadeiras. Para vivenciar plenamente a dúvida universal, portanto, Descartes evoca a figura do Gênio Maligno, que seria um ser extremamente poderoso e que faria de tudo para sempre nos enganar. Ao supor sua existência, portanto, Descarte consegue transformar razões de duvidar em verdadeiras crenças, permitindo-se que de fato se atinja uma real suspensão de juízos e se vivencie realmente a dúvida universal, já que essa nova crença se equilibraria com as antigas.

O artifício do gênio maligno, portanto, é apenas uma metodologia psicológica. Tomar tudo que é duvidoso como falso não faz parte da operação lógica da dúvida metódica. A operação lógica consiste somente em se tomar como inteiramente duvidoso que apresentar o mínimo grau de dúvida. O papel de se estabelecer a dúvida metafísica através da lógica caberá somente ao argumento de Deus Enganador, que a estabelece de fato. O Gênio Maligno apenas instaura psicologicamente tal dúvida, ao transformar as razões de dúvidar em uma negação, em uma crença. Isto, no entanto, de modo algum elimina a dúvida, mas de fato só a fortalece, já que a instaura também no plano psicológico.

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